Para mim, eram pequenos pés descalços e sujos pela terra batida e
que há tempos não eram lavados. Para ela, estava usando sapatos de
cristal e que por onde passassem sempre haveria um tapete vermelho os
esperando. Para mim, ela usava roupas gastas e que o tempo e o
constante uso transformaram-nas em trapos. Para ela, o vestido mais
belo de toda a corte. Para mim, era apenas um barraco erguido por
restos de tábuas e coberto por lona. Para ela, seu castelo.
O sol do meio dia esquentava com todas as suas forças aquele
barraco, fazendo-o parecer o lugar mais quente para se estar. Mas
para Emily, aquele sol era a estrela mais bela e bonita que já tinha
visto e ela estava lá. Sentada no chão ao lado de suas havaianas
gastas ela me olhava. Provavelmente pensando o porquê da minha
visita inesperada ao seu reino. Essa estranha seria de confiança?
Que roupas são essas que ela está usando? Por que ela tanto me
olha? E afinal, por que ela está aqui? E Emily mantinha seus
pequenos olhos fixos em mim.
Já se passaram alguns dias que eu a vi, e aqueles olhos ainda não
saíram dos meus pensamentos. A curiosidade estampada no rosto
daquela criança de quatro anos ainda estava em minha mente. Eram
dois mundos completamente distintos que haviam se encontrado e
perguntas foram levantadas. Mas não houve tempo. Eu não pude saber
qual a brincadeira preferida de Emily. Nem mesmo seu sobrenome. Eu apareci como uma forasteira que chega a terras desconhecidas apenas
para tirar o que fosse de interesse próprio daquele lugar e assim,
ir embora. Às vezes penso que Emily sabia disso. Sabia que nunca
mais me veria de novo. E talvez seja por isso que aqueles olhos me
olhavam tão fixamente. E havia um rosto, um rosto sem sorriso algum.