sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Emily


 Para mim, eram pequenos pés descalços e sujos pela terra batida e que há tempos não eram lavados. Para ela, estava usando sapatos de cristal e que por onde passassem sempre haveria um tapete vermelho os esperando. Para mim, ela usava roupas gastas e que o tempo e o constante uso transformaram-nas em trapos. Para ela, o vestido mais belo de toda a corte. Para mim, era apenas um barraco erguido por restos de tábuas e coberto por lona. Para ela, seu castelo.
O sol do meio dia esquentava com todas as suas forças aquele barraco, fazendo-o parecer o lugar mais quente para se estar. Mas para Emily, aquele sol era a estrela mais bela e bonita que já tinha visto e ela estava lá. Sentada no chão ao lado de suas havaianas gastas ela me olhava. Provavelmente pensando o porquê da minha visita inesperada ao seu reino. Essa estranha seria de confiança? Que roupas são essas que ela está usando? Por que ela tanto me olha? E afinal, por que ela está aqui? E Emily mantinha seus pequenos olhos fixos em mim.
Já se passaram alguns dias que eu a vi, e aqueles olhos ainda não saíram dos meus pensamentos. A curiosidade estampada no rosto daquela criança de quatro anos ainda estava em minha mente. Eram dois mundos completamente distintos que haviam se encontrado e perguntas foram levantadas. Mas não houve tempo. Eu não pude saber qual a brincadeira preferida de Emily. Nem mesmo seu sobrenome.  Eu apareci como uma forasteira que chega a terras desconhecidas apenas para tirar o que fosse de interesse próprio daquele lugar e assim, ir embora. Às vezes penso que Emily sabia disso. Sabia que nunca mais me veria de novo. E talvez seja por isso que aqueles olhos me olhavam tão fixamente. E havia um rosto, um rosto sem sorriso algum.


quinta-feira, 6 de setembro de 2012

What's new Buenos Aires? 3ª dia

E no dia anterior ficamos com uma dúvida: ir ao zoológico em que se brinca com os leões e tigres, podendo até dar mamadeira para os filhotes, ou visitar o chamado Delta do Tigre? Acabamos ficando com a segunda opção. Acordamos e ficamos esperando no hall de entrada pela guia chegar às 9 da manhã. Iríamos fazer um passeio de barco pelo rio da Prata e para isso teríamos que sair de Buenos Aires rumo a San Isidro. A cidade era como se estivéssemos em uma cidade de bonecas. Tudo tão bonito e aconchegante. Paramos em uma praça, para visitar a igreja da cidade e ir à feira, podendo tomar um bom chocolate quente. E podem acreditar, com o frio que estava, só no que pensávamos era chocolate quente. Acabei queimando a língua, mas isso é apenas um detalhe. Na pequena feira da pracinha, havia uma barraquinha em que um senhor vendia alfajores. Mas não pense naquele alfajor coberto de chocolate que você conhece. Esse era o tradicional alfajor argentino. Apenas a massa e o doce de leite e coco ralado cobrindo. Ele nos ofereceu para que pudéssemos experimentar e ver se era realmente bom. E o que eu posso dizer? Me arrependi de não ter comprado todos os alfajores daquela banca.





Próxima parada: Pegar o barco. Até então eu venho falando do frio. Mas agora é que  o frio é de verdade. Beira rio e ventos fortes geraram rosto queimado para a Anamaria no final do dia. Então o passeio começou. Para chegar ao rio mais largo do mundo, com 219 Km de largura, tivemos que passar pelo rio Tigre e é nesse rio que encontrei uma das coisas mais curiosas que já vi: Ilhas em que pessoas com muito dinheiro vivem nelas. Algumas vão passar apenas o final de semana, mas a maioria realmente mora lá. Para chegar, apenas de barco ou lancha. Existem os barco taxi, barco bombeiro, barco supermercado, barco lixeiro, barco hospital e assim por diante. A maioria com dia e hora marcada para se passar. Roubo? Praticamente nulo. E assim a Thamy pensou em passar a sua velhice nesse lugar. Quanto a mim, não sei se aguentaria estar tão longe assim de uma Starbucks. Ahh esqueci de mencionar, as casas possuem nomes. Se você quiser ir a uma delas, deve dizer o nome do rio, ilha e nome da casa. Tinha uma que chamava Samba (rs).







Foi então quem entramos no Rio da Prata que de prata não tem e nunca teve nada. Não se vê o fim dele, literalmente. O nosso pequeno barco tentava passar entre as grandes embarcações carregadas de mercadorias europeias enquanto eu, dava uma cochiladinha. Sim, ver água por muito tempo cansa. Enfim, desembarcamos novamente em Buenos Aires e para a nossa alegria o almoço que estava incluído no passeio seria no Puerto Madero. E mais uma vez, pedimos carne como prato principal. Carne com batata frita. Pudemos apreciar o dono do restaurante indo à nossa mesa para nos cumprimentar, belo dono por sinal não é mesmo Thamy? (rs) E pudemos acompanhar um casal de brasileiros dando chilique ao nosso lado porque a sobremesa Romeu e Julieta que deveria ser queijo com goiabada, veio queijo com marmelada, mas antes esqueceram de estudar o cardápio argentino e verificar que essa sobremesa argentina é com marmelada. Mas entre mortos e feridos, todos se salvaram. Agora, ir para o hotel para nos encontrar com a minha linda prima Sulamita, que iria dar um passeio conosco e nos apresentar a noite argentina. Ela chegou com sua amiga argentina, o que facilitou muito para não passarmos muita vergonha. Eu digo muita, porque vergonha, nós passamos.


Pedimos que ela nos levasse ao Hard Rock Café. Sim, ele é bonitinho, mas não compensava pagar para entrar. Apenas demos uma rápida olhada e fomos para o grande movimento que havia do lado de fora. Estava acontecendo uma exposição de arte moderna em uma galeria aberta ao público. Bandas de rock, danças, psicodelia, pessoas grafitando, drogas, e um pessoal bem alternativo.  Muito legal, falando nisso. Depois paramos para comer em uma pizzaria. Nossa, e que pizza. Tinha muzzarela de sobra e ah, eles colocam alho picado por cima. Cerveja? Só Stella litrão e 45 pesos cada. Tenso. No fim, todas estavam satisfeitas e muito cansadas. Agora, voltar ao hotel, dormir e ficar pronta, para o grande dia: DIA DE COMPRAS.


sábado, 1 de setembro de 2012

As filhas do espetáculo

A gente sente pena. É só isso o que nos resta. Sentir pena dessas pessoas. São elas as Filhas do Espetáculo. São essas que oferecemos ajuda, damos conselhos e elas simplesmente pegam tudo isso e jogam no lixo. Mas antes, elas amassam e dizem "A vida é minha e dela cuido eu". Pegam a sua ganância, hipocrisia, falta de vergonha e egocentrismo, colocam tudo na mala e saem por ai. Pois o seu trabalho é por ai. Montam o circo. Fazem cara de simpatia. Oferecem tudo, tudo o que possuem a fim de garantir o seu público. Para esse fim, causam uma discórdia aqui, outra ali, se metem em encrenca e dessa forma trazem todas as atenções para si. Então o ego infla e esse é o sinal para adentrarem no picadeiro. Ele está iluminado por muitos holofotes. Fazem um pequeno discurso, seguido pelo show e finalmente agradecem e esperam os aplausos. Mas então eles não vêm. O que vem no lugar são o que a plateia encontrou no lixo. E isso incluindo os "eu te avisei" e demais conselhos que foram jogados fora por elas. Mas para as Filhas do Espetáculo isso faz parte da cena. Agora elas choram, fingem de arrependidas. Pedem perdão e dizem que mudaram. Umas acreditam. Pagam pelo show e vão embora dizendo que voltarão para dar apoio. Já outras sentem pena. É só isso que lhes restam. Sentir pena. Pegam os centavos que possuem no bolso, jogam no chão e vão embora. Nunca mais voltarão. E vão dizendo "bem que a minha mãe me avisou". Estas, são Filhas da Vergonha na Cara.

segunda-feira, 2 de julho de 2012

What's new Buenos Aires? 2º Dia

08/06/2012

Acordamos às 07:00 h. Nunca havia visto a Thamy pular tão rápido da cama em toda a minha vida. Agora era a hora de começar o primeiro ritual de botar o máximo de roupa que conseguíssemos em menor tempo. Foi então que o telefone tocou. Pânico. Lá vai a Anamaria que havia feito 1 ano de espanhol. Grande coisa. "Hola??" foi o que eu tentei fazer. Mas escuto do outro lado um "Bom dia" meio com sotaque e percebo que era a nossa guia do city tour ligando para confirmar o passeio de 3 horas logo às 09:00 h, tudo em português. Coisa linda. Passeio confirmado.

Descemos para tomar o café, achando que UAU seria o máximo. Iríamos comer alimentos argentinos que nunca havíamos comido antes. Grande ilusão. Era uma tentativa muito mal feita da comida brasileira. O pão francês era duro igual pedra e a salada de frutas tava mais para suco de pacotinho com algumas frutinhas para enfeitar. Mas então eu vi uma linda rosca no formato de um croissant denominada Medialuna. Isso é para os lanches e cafés da manha deles o que o pão francês é para nós. E lá vai a Anamaria toda feliz. ECA. Uma rosca seca com uma calda amarga por cima. Achei melhor parar de comer. 

Fomos para a recepção esperar a nossa guia. Não esperamos muito e lá estávamos saindo às pressas do prédio loucas para entrar logo na Van. Não, não era tanto a animação, mas sim o frio. Passeamos pelos principais bairros da cidade podendo escutar a histórica de cada um. Mas foi na Boca a melhor parte. Para quem não sabe é nesse bairro que vão surgir os dois principais times da cidade: Boca Juniors e River Plate. Para decidir quem ficaria com um bairro, foi realizado um jogo e quem perdesse deveria se retirar. Não preciso dizer quem ganhou né? E ah, sabiam que o primeiro uniforme do Boca era rosa? Acontece.

Mas nesse bairro também, há muito tempo atrás era o que podemos chamar de zona vermelha. Local de bordéis, cortiços e se preparem... do tango. Sim, o tango surgiu em meio a marginalidade e foi só na década de 40 que os ricos decidiram tomar posse. Lá podemos encontrar o Caminito, que é o que sobrou desses locais. Com casas muito coloridas ( usavam restos de tintas, por isso a diversidade) foi um local muito divertido para se tirar fotos. Lá também a Ina recebeu a sua primeira cantada, dessa vez um cara vestido de dançarino de tango e que a chamou de "gatinha". 

Saímos do Caminito e fomos parar na Casa Rosada. A guia fez questão de avisar que logo logo aconteceria uma manifestação, algo muito comum por lá e a ruas seriam fechadas. Então só tínhamos 15 min. Acabamos por entrar em uma lojinha cheia de coisas bonitinhas para se comprar e acabamos perdendo a hora e quando vimos não deu para ver coisa nenhuma o local de trabalho da Barbie Argentina ( presidenta). Próxima parada: Tango portẽno para uma aula de tango. É óbvio que fugimos.  Precisávamos encontrar algo muito, mas muito mais importante. A livraria El Ateneo.




Foi então que andamos, mas andamos, mas andamos e andamos. E sempre que perguntávamos a resposta era " é daqui a duas quadras". Uhum. Mas foi então que estávamos desistindo de encontrar o paraíso que ele simplesmente apareceu em nossa frente. Eu nunca tinha visto algo tão maravilhoso que juntava duas coisas de que eu amo: livros e teatro. Os donos da livraria compraram um teatro abandonado e restauraram instalando a livraria em seu interior. Hoje, ela é conhecida como  a segunda livraria mais bonita do mundo. E foi um momento lindo. Quanto mais fotos eu tirava, mais eu queria tirar. Mas eu não poderia ficar lá para sempre. Buenos Aires nos chamava e a fome também. Decidimos simplesmente entrar no primeiro lugar que aparentemente servia comida. E entramos. Era uma pequena lanchonete/restaurante, bem aconchegante. Pedimos o cardápio. Cara de interrogação da garçonete. Fizemos gestos. Ela " ahhh, o Menu", claro. Porque não pensamos antes. Pedimos então o que parecia mais com o que estávamos acostumadas a comer: macarrão com frango, molho branco, presunto e cogumelos. Quando chegou, eu nunca tinha visto um prato tão grande de macarrão. Comi 1/4. Mas estava muito gostoso, apesar de sem sal. Mas na Argentina eles como tudo muito sem sal. Cheias e entupidas fomos embora.

Então pegamos um taxi. Pedimos para ir ao Hard Rock Cafe. Acho que o taxista não entendeu. Ns deixou na Recoleta. Ta tudo bem. Lá tinha o cemitério que a Evita estava enterrada e eu precisava fazer o show que eu havia prometido. O duro, foi achar o túmulo da mulher. Procuramos no mapa, mas ninguém lembrava o nome completo. Foi então que uma americana nos mostrou o nome dela e conseguimos achar. Túmulo 88. Lá fomos nós. Que broxante. O túmulo mais chulé de todos. Ta certo que ela era do povo. Mas tanto assim? Mas é claro que não desanimei. Comecei a cantar "Dont' Cry for me Argentina" com todo o meu ânimo, mas fui reprimida por minhas amigas, pois acho que incomodei umas 15 pessoas no local. Pena.



Precisávamos voltar para o hotel, para nos preparar para mais uma aventura: Tango portẽno. Dessa vez iríamos assistir a um espetáculo de tango antecedido por um maravilho jantar, com a melhor carne bovina que eu já comi em toda a minha vida. Para irmos nos arrumamos como damas. Dessa vez nosso guia era um cara muito divertido que não me lembro o nome dele agora. Ele pegou a gente para Cristo. Cheio de gracinhas. Inclusive se intrometeu em fotos.


Entramos e então começamos a comer. Escolhemos a entrada. Cada uma escolheu um prato para podermos experimentar de tudo. Tudo maravilhoso. Mas no momento de escolher o prato principal todas fomos muito objetivas: queremos a carne. E que carne. Foi a carne crua mais esplêndida de toda a minha vida. E claro, comi regada a um bom vinho. E foi então que não cabia mais nada que me apareceu a sobremesa. Um prato com sorvete de doce de leite, pudim com doce de leite em cima e uma fatia de queijo com marmelada. Lindo. Foi então que o show começou. Foram 1 hora e meia de puro tango, das mais diferentes formas. Difícil de se esquecer. E claro, chegamos no hotel mortas. Mas com o coração cheio de alegria. Isso era só o começo.


To be continued....



quarta-feira, 20 de junho de 2012

Como num sopro


Não terminou de ler os livros que comprou. A pilha com seus marcadores ainda estão jogados na mesa empoeirada. A xícara de café outrora quente, agora mancha uma escrivaninha cheia de papéis amaçados. O espelho ainda guarda fotos de amores, amigos e ídolos. O celular ainda vibra para informar a chegada de uma nova mensagem. Mas ela jamais verá tudo isso novamente. Como tudo na vida passa de forma rápida, essas coisas passaram e provavelmente ficaram gravadas em sua pupilas. Inerte, com olhos ainda estatelados, ela ainda segura a pistola calibre 32. O sangue ainda escorre pelos seus cabelos sujando todo o cobertor de sua cama recém arrumada.

Mais uma vida se vai. Assim, tão rápido. Familiares, amigos, vizinhos e conhecidos se perguntarão o porquê. Ela nunca demonstrou uma única insatisfação. Sorria a todo tendo, cantava, dançava e adorava viajar. Em seus 20 anos de vida conhecera 10 países e em seus planos estava a clássica Grécia para ainda conhecer. Teve muitos namorados. Não amou a maioria, e teve o coração partido exatamente por dois que acreditou ter amado. Isso se possível amar dois homens com a mesma intensidade. Vivia de frases ditas por Marilyn Monroe, Clarice Lispector, Charles Chaplin e Bukowski. Não tinha suas próprias frases. Talvez por acreditar que era mortal demais. Apesar de seu signo, não se importava muito com dinheiro. Tendo para viajar, viveria a pão, água e sexo. Não se importava. 

E assim, como em um piscar de olhos todos esses sonhos, desejos, arrependimentos e dores foram deixados para trás mais cedo do que deveriam. E o porquê ainda circulará por entre aqueles que achavam que conheciam Cibele. Na verdade ninguém conheceu Cibele. Ela sempre soube disso.
Ela sempre soube. 

What's new Buenos Aires? 1º Dia

Diário de Bordo - 07/06/2012


- Qual o destino?
- Buenos Aires.



Tínhamos toda a certeza do mundo: queríamos ter a nossa primeira viagem internacional para a bela e tão comentada pelos brasileiros, Buenos Aires. Mas lá no fundo eu só sabia de cinco coisas dessa cidade: primeira, que eles amam Evita Perón. Segunda, que eles comem carne muito, mas muito mal passada. Terceira, idolatram o Maradona. Quarta, é a cidade do Tango. E quinta, é um pedaço da Europa na América do Sul. Para ser sincera, meu grande sonho foi fazer aquelas viagens com mochila nas costas por toda a Europa. Mas por motivos financeiros e tempo, preferi ter um gostinho desse lugar de forma mais barata e rápida. Não esperava tanto.

 Comprei a minha passagem acreditando que iria para um lugar, legal. Mas assim que a vi, lá de cima, da janela do avião, percebi que eu, reles mortal estava completamente enganada. A começar pelo frio que eu senti assim que sai pela porta do avião. Era como se fosse um "Acorde garota, a aventura  é para agora". Temperatura: 4ºC. E assim que pisei em território porteño ( é assim que se chamam aqueles que nascem em Buenos Aires) eu percebi que até então minha vida é que tinha sido legal. Aquele lugar era o gostinho do maravilhoso.

Entrei no ônibus que nos levaria para o hotel. Eram quase meia noite. Primeira coisa que notei? Ao lado do motorista denominado "Chocolate" havia uma cestinha com um dólar colado nela. Apresento-vos o que eles chamam de propina. Para nós brasileiros isso seria crime não? Mas para eles esse nome é dado ao que conhecemos como gorjeta. E sim, lá pedem propina (rs) até para você utilizar o banheiro público. Somos obrigados a dar o dinheiro? Não. Somos obrigados a escutar xingamentos consequentemente? Sim. Mas como diria um provérbio antigo, o mundo é dos espertos. Eles por se apossarem de lugar público e pedir dinheiro para usarmos. E eu, por fingir que não entendia o que falavam e não pagava.


Chegamos ao hotel. Momentos de tensão. Conversar com o recepcionista. Pânico. Nos aproximamos e escutamos: Boa Noite. Alívio. Sim, eles arranhavam o português, assim como a maioria dos porteños que trabalham na área de turismo, pois claro, os brasileiros alimentam o bolso argentino. Aliviadas, subimos para o quarto. Cada uma escolheu a sua cama: A Ina, com a do lado do aquecedor. Por ser a mais magra e raquítica era o melhor a se fazer. Eu, fiquei com a do lado do banheiro. Quem me conhece, entenderá. E a Thamy com a do meio, assim poderia comandar com mãos de ferro as duas por ela denominadas de "lerdas".

Sentamos cada uma em suas respectivas camas. Estava frio, muito frio. O aquecedor acabara de ser ligado a 25º C, mas ainda não produzia efeito algum. Nos olhamos. Parecia não ser verdade. Sorrimos e enfim pudemos dizer "Estamos em Buenos Aires". Após passarmos o dia de aeroporto em aeroporto, e ter esperado oito horas no aeroporto de Guarulhos mortas de cansaço, simplesmente, dormimos.

 Às sete da manhã do dia seguinte acordamos prontas para cantar como Madonna interpretando Evita Perón no musical Evita, " What's new, Buenos Aires? Sou recém-chegada e louca por você...E você será por mim também".

To be continued...








quarta-feira, 4 de abril de 2012

insatisfação





Sinto saudades do que nunca tive. Tenho vontades inesperadas, guardo gulas insaciadas e choro rios por nada. Desejo ter o impossível e o que eu tenho não me satisfaz. Quero sorvete de pistache no café da manhã, café com leite morno no almoço e você no jantar. E que você fique mais um minuto antes de me deixar. Fique mais cinco minutos. Apenas cinco minutos e assim me sentirei mais querida e iludida. Talvez a ilusão possa cobrir o que sempre fica perdido aqui em algum lugar. Sabe, se me perguntarem se estou bem, sempre confirmarei positivamente e assim morrerei mentindo. Tudo o que eu tenho sempre vai embora. Talvez essa seja a minha sina. Eu estou condenada. Mais do que você imagina. E o meu caminho depois da morte será o inferno. Sim, o inferno. Por fazer as pessoas acreditarem que um dia eu fui eu mesma. Talvez Marilyn me entenderia.

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Pecado Capital


Tratando-se de você, nunca acredite no que eu falo. Sempre serão mentiras. Se eu disser "Suma!" eu estou gritando para você ficar em minha vida até o final. Se eu disser que não sinto nem um pouco de ciúmes, saiba que a cada tropeço seu quem cai sou eu. Inclusive eu poderia arrumar dez motivos para te odiar, por exemplo, mas sabe garoto, é só escutar a sua voz para acreditar na impossibilidade desse pecado. Você me pirraça, irrita, mente, grita, finge não se importar, mas depois chora. Pede intermináveis desculpas, me abraça por três dias seguidos, compra chocolate e diz que me ama. Então você me pirraça, irrita, mente, grita e finge não se importar. Sinceramente, pecado mesmo é a gente. Dos Capitais. Aquele que sabemos que é errado, nos levará para o inferno e nos fará queimar na eternidade, mas continuamos praticando até quando der e quiser. Talvez Gula, Luxúria ou até mesmo Vaidade. Quem sabe todos? Mas não me importo.
Querido, amor sem dor não é divertido.

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Quem diria?


Ainda lembro de quando você me disse que nunca me abandonaria. Seríamos um do outro até o fim de nossas vidas e se a eternidade existisse, estaríamos lá também. Ainda lembro do dia em que você riu da minha mania de sempre dormir no seu colo enquanto você cantava para mim. Ainda lembro daquele banho de chuva que tomamos quando fazíamos trilha no raio que o parta. Ainda lembro dos seus olhos castanho escuro. Ainda lembro da forma como você chamava pelo meu nome. Ainda lembro da primeira vez que nos vimos. Da segunda, da quarta, da quinta e da sexta quando você me disse "Oi". Ainda lembro daquela calça que eu odiava e que você só usava para me implicar. Ainda lembro das suas mensagens que me enviava de madrugada. Eu ainda as tenho. Ainda lembro daquela mensagem ao vivo com o Roberto Carlos cantando de fundo que você me mandou na faculdade no dia do meu aniversário. Fiquei sem falar com você uma semana por causa disso. Ainda lembro de você brincando com os meus sobrinhos como se você também fosse criança. Eles ainda perguntam por você. E eu ainda lembro da última vez que nos falamos. Você me pediu perdão por ter que me abandonar tão cedo. Disse que me encontraria na eternidade, mas eu mandei você calar a boca. A culpa era dele. Toda dele. Eu pedi várias vezes para você parar e que aqueles seus novos amigos eram má companhia. Mas você já havia se rendido. "Se picar" virou o verbo que te guiava. Aí ele te achou. Ele, tão cruel e mortal.
Eu ainda lembro da última vez que você segurou em minha mão. Você apertou o mais forte que pôde e disse "Adeus". Foi quando ele te levou.
Vírus idiota.


quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Felizes para sempre?


"Então a princesa foi salva pelo príncipe e eles viveram felizes para sempre". Era assim que seu pai terminava de ler as histórias quando a ia colocar para dormir. E Katrina aprendeu a acreditar no que muitas outras meninas ainda acreditam: no "Felizes para sempre". "Ele vai vir mãe" ela dizia, "Isso são apenas contos de fadas" dizia a sábia mãe por tras de uma risada. Mas foi então que olhando para o espelho que ela descobriu: "ele não virá nunca". Katrina usava óculos, o que escondia seus lindos olhos, era gordinha, usava aparelho e seu cabelo tinha vida própria. "É, ele não virá mesmo" repetiu para sí mesma naquela noite e em todas as outras noites de sua adolescência. E como se já não bastasse, certo dia o seu pai não pôde mais estar ao seu lado tentando a fazer mudar de ideia. Ele foi para um lugar bem melhor do que esse mundo meia boca.

O tempo passou. Katrina emagreceu, tirou os óculos e o seu sorriso agora combinava com seus olhos. Quanto ao cabelo? Katrina deu um jeito. Homens e mulheres a enchiam de elogios, flêrtes e cantadas, mas lá no fundo ela ainda era aquela menina feia e sozinha. Há tempos Katrina já dissera Foda-se ao "Felizes para sempre"e agora tentava encontrar alguém para preencher pelo menos aquele vazio em seu peito. Nunca conseguiu. Assim como o verão chega trazendo o calor e chuvas quentes no final da tarde eles chegavam e a fazia feliz. Mas esse verão ia embora e ela ficava ali no meio de uma eterna tempestade que percorria todo o seu outono e congelava no inverno. "As tempestades passam e logo vem a bonança", mas parece que o deus do tempo não ia com a sua cara e a havia excluído dessa regra.

Mas certa tarde, quando assistia a um filme acompanhada do seu melhor companheiro, o chocolate quente, certo comentário da personagem lhe foi jogado na cara assim como aquelas raspadinhas que ela recebia no colégio: " ...quando era criança, eu ia para o campo para ver as joaninhas, esperei por horas e horas, cansei e adormeci, quando acordei estava coberta por elas...".
Adormecer. Assim como Alice.
E ela adormeceu.
Quando acordou, lá estava ele. Ou talvez ele sempre esteve lá, mas ela nunca tinha ligado para as joaninhas.

terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Blackbird

E foi olhando para o céu que ela o viu pela última vez. Ela sabia que um dia ele iria embora, mas não imaginava o quanto ia doer ter que vê-lo partir. Estava feliz, claro. Blackbird havia melhorado e agora teria o céu para si novamente. Mas ao mesmo tempo Mary não queria que ele se fosse. Desde o dia em que ela o encontrou ele passou a ter uma parte naquele coração antes tão solitário. Todos os dias depois de enfrentar telefonemas, atendimento à imprensa e coletivas, vida que para uma assessora como ela só com café para ajudar, Mary sentava naquele mesmo banco da praça, embaixo daquela árvore que estava ali antes mesmo da cidade existir. Estava no meio de uma discussão consigo mesma do porquê de tudo aquilo, de tanta coisa ruim vindo como uma enxurrada em sua vida, quando ele caiu. No começo levou um susto e depois ficou imaginando como podia existir coisinha tão feia. Em seguida veio o sentimento de culpa por ter pensado tão mal daquele pobre passarinho. Sua asa estava quebrada e precisava de ajuda. Mary o levou para casa e tomou uma decisão que até então nunca tinha passado por sua cabeça. Cuidar de alguém. Ela tinha medo. Mary tinha medo de se apegar e de se tornar dependente. Isso não era para ela, uma jornalista de 30 anos e independente. Mas ele era só um pássaro e que mal haveria em cuidar de um? Mas Mary caiu no jogo do seu próprio medo. Passou a sair do trabalho e ir direto para casa, só para ver logo como ele estava. Há três dias ele já tinha voltado a cantar e sempre que ela chegava ele começava a se apresentar para ela. Blackbird havia se tornado o seu único amigo e fiel companheiro. Todas as suas tristezas, dúvidas e desabafo era a ele que ela recorria. Era um monólogo, mas ela precisava dele. Foi então que Mary reparou no seu grande e invisível egoísmo. Não era ali que Blackbird deveria estar e sim fazendo aquilo para o qual ele nasceu. Doía, mas era isso que deveria ser feito. Ele deveria ser livre. E era no céu o seu lugar. Mas como deixar partir alguém que tornou a sua vida tão especial em tão pouco tempo? Ela havia se tornado responsável por ele e dependente do seu canto e presença, mas obrigar Blackbird a ficar não seria certo. Foi então que com o coração partido e com lágrimas nos olhos Mary o deixou partir. E foi olhando para o céu que ela o viu pela última vez.



Blackbird havia partido, mas deixado para trás um coração que agora sim sabia o verdadeiro valor de poder cuidar de alguém.